Uma pesquisa exclusiva revela que as empresas brasileiras são as mais centralizadas do mundo. Por aqui, os chefes não ouvem nem dão satisfação. Mas o futuro é dos democráticos, e não dos mandões
O paulistano Roberto Setubal, presidente do Itaú Unibanco, cresceu numa época marcada pelo autoritarismo. Durante sua juventude, nos anos 60 e 70, as decisões não se discutiam. Cumpriam-se. Era assim em casa. Era assim na política. E era assim no trabalho
Quando ele começou a carreira no banco presidido por seu pai, Olavo Setubal, o Itaú era uma das instituições mais formais e hierarquizadas do Brasil. Cada executivo tinha sua sala, sua secretária e sua vaga de garagem. Os crachás tinham cores diferentes para cada cargo.
A evolução na carreira acontecia em doses homeopáticas e dependia do bom relacionamento com o chefe. Foi com essa cultura que o Itaú se transformou numa das maiores e mais respeitadas empresas brasileiras. Mas, nos últimos anos, Setubal está empenhado em criar um ambiente mais democrático.
Ele mesmo está tomando menos decisões. Deixou, por exemplo, de escolher as novas agências. Também não participa mais da definição dos preços. Não tem autonomia sequer para escolher os diretores que responderão a ele mesmo. “Os tempos mudaram. Não podemos mais impor uma decisão sem ouvir os funcionários”, diz Setubal.
Aumentar a democracia no ambiente de trabalho é um desafio comum a muitas empresas brasileiras. Uma pesquisa exclusiva da consultora Betania Tanure mostra que as companhias brasileiras estão entre as mais centralizadoras do mundo. Em 2011, Betania entrevistou 4 500 executivos em 13 países das Américas, da Europa e da Ásia para chegar a um índice batizado de “distância do poder”.
Quanto mais elevado, numa escala de zero a 100, mais distantes as pessoas estariam de definir os rumos da companhia. Aos entrevistados, a consultora fez perguntas como: “Com que frequência os funcionários têm medo de dizer que discordam de seus superiores?” ou “Quem detém o poder tem direito a privilégios especiais?” O resultado do estudo: no ranking dos mais centralizados, deu Brasil na cabeça.
É importante separar hierarquia de autoritarismo. Empresas são hierárquicas por natureza. Precisam de pessoas que mandem, e de outras que executem. E, sobretudo, precisam de líderes que inspirem e indiquem os caminhos. É assim tanto no Brasil quanto na Dinamarca — o país mais democrático do ranking.
Mas as empresas brasileiras, aponta o estudo, dão importância excessiva ao cargo. Numa típica empresa centralizada, os chefes mandam e desmandam sem dar satisfações. Eles têm autonomia, por exemplo, para decidir quem será contratado ou demitido. Com alguma frequência, dão preferência aos amigos em detrimento daqueles que alcançam os melhores resultados.
Também não passa pela cabeça de uma empresa autoritária consultar os funcionários antes de tomar decisões. Metas, bônus, orçamento — tudo é decidido a portas fechadas. Quem está abaixo sabe muito pouco sobre os rumos da companhia.
Riscos
Concentrar as decisões tem lá suas vantagens. As empresas mais centralizadas conseguem decidir mais rapidamente e dar guinadas estratégicas da noite para o dia. Em momentos de crise, como no fim de 2008, essa agilidade é fundamental. “Quando o navio está afundando, é o comandante quem dá as ordens.
Nessas horas, não é possível ouvir a todos”, diz Betania. Mas, no que tem de pior, o centralismo atravanca a inovação e dificulta a atração de pessoas mais talentosas. Setubal, do Itaú, se deu conta disso. Apesar de seu poder, a empresa passou a encontrar dificuldade em atrair e reter os executivos mais promissores.
Eles se interessavam cada vez mais por bancos de investimento ou por pequenas empresas onde tivessem autonomia para tomar suas decisões e onde fossem premiados pelos resultados. Para responder a isso, o Itaú criou, em 2010, um inédito programa de sócios, que deu ações do banco a um grupo de 100 funcionários de alto desempenho. Hierarquia ou tempo de casa não contaram.
Em 2011, o Itaú deu mais um passo na direção da democracia. Desde então, nenhum executivo do banco tem autonomia para escolher seu sucessor. As promoções são definidas em comitês que reúnem cinco pessoas e que decidem com base nos resultados.
“A gente podia até continuar mandando como antes”, diz Marcelo Orticelli, diretor de recursos humanos do Itaú. “O problema é que havia o grande risco de os mais jovens simplesmente pararem de obedecer.”
Democracia também costuma trazer mais eficiência. Se apenas um grupo de pessoas tem acesso às informações e toma todas as decisões, os funcionários não entendem qual é seu papel dentro da estratégia. E não se levantam da cadeira para ajudar. Mas, se sabem que a empresa precisa economizar energia, apagarão a luz ao sair da sala.
É o que está acontecendo na empresa de controle de frota Sascar, comprada pelo fundo de investimento GP em 2011. Todos os meses, os 700 funcionários recebem por e-mail dados sobre vendas e geração de caixa. E podem sugerir ações para melhorar o resultado no mês seguinte.
Os 100 executivos recebem também informações sobre suas metas individuais. E definem o que deve ser feito para melhorar no mês seguinte. “Essas ações ajudaram a aumentar nossa receita em 30% no ano passado. Foi o melhor resultado dos últimos cinco anos”, diz Marcio Trigueiro, presidente da Sascar.
Na varejista Riachuelo, as vendas crescem, em média, 20% ao ano desde 2007, quando o presidente, Flávio Rocha, deu a seus executivos a liberdade de escolher um modelo de remuneração. Em vez de dividir igualmente os lucros, eles preferiram criar um ranking. Os melhores podem ganhar até seis salários extras por ano. Os piores não levam nada.
São vários os motivos que explicam a liderança do Brasil no ranking de centralização. Segundo Betania Tanure, é uma questão cultural. Os povos de origem latina, diz, questionam menos a autoridade de seus líderes na família, na política e, consequentemente, também nas empresas.
Além disso, empresas estatais e grupos familiares, que são mais centralizadores por natureza, têm enorme peso na economia brasileira. Não se rompe com essa cultura da noite para o dia. A maioria das empresas ainda dá seus primeiros passos. A Alpargatas, por exemplo, até cinco anos atrás tinha inacreditáveis 16 níveis hierárquicos.
Existiam, por exemplo, o gerente de setor, o gerente de área e o gerente de departamento. Os níveis foram reduzidos aos poucos e hoje são apenas seis. Pode levar décadas até que companhias como a Alpargatas cheguem ao nível de abertura da Promon — isso se elas quiserem, é claro.
Faz 42 anos que a empresa criou seu primeiro programa de sócios. Hoje, 1 300 de seus 1 600 funcionários têm ações que permitem votar nas eleições para diretores e conselheiros. A dose ideal de descentralização, cada companhia vai encontrar com o tempo. “Se as empresas querem atrair gente boa, terão de ouvi-las”, diz Roberto Setubal. “É um caminho sem volta.”
Lucas Amorim: Author
Haroldo Wittitz: Editor and Publisher
The trend in business is to have less
An exclusive survey reveals that Brazilian companies are more centralized in the world. Here, the heads do not hear or give satisfaction. But is the future of democracy, and not the bossy
The Sao Paulo Roberto Setubal, president of Itau Unibanco, grew up in a time marked by authoritarianism. During his youth, in the 60 and 70, decisions are not discussed. Is fulfilled. It was so at home. It was just politics. And so was the work
When he began his career on the bench headed by his father, Mr. Setubal, Itau was one of the more formal and hierarchical institutions in Brazil. Each executive had his office, his secretary and his parking space. The buttons have different colors for each position.
The career development happened in homeopathic doses and depended on the good relationship with the boss. It was this culture that Itaú became one of the largest and most respected companies in Brazil. But in recent years, Setubal is committed to creating a more democratic environment.
He is taking fewer decisions. Left, for example, to choose the new agencies. Also no longer part of the pricing. Do not even have autonomy to choose the directors who will answer himself. “Times have changed. We can not impose a decision without hearing the employees, “says Setubal.
Increase democracy in the workplace is a challenge common to many Brazilian companies. An exclusive survey of consultant Betania Tanure shows that Brazilian companies are among the most centralized of the world. In 2011, Bethany interviewed 4,500 executives in 13 countries of the Americas, Europe and Asia to reach an index called “power distance”.
The higher on a scale of zero to 100, far more people would be to define the direction of the company. Respondents, the consultant asked questions like: “How often employees are afraid to say who disagree with their superiors?” Or “Who wields power is entitled to special privileges?” The study results: the ranking of the most centralized Brazil has in mind.
It is important to separate hierarchy of authoritarianism. Companies are hierarchical in nature. Need people to send, and other running. And above all, need leaders who inspire and show the paths. Thus both in Brazil and Denmark – the most democratic country in the ranking.
But Brazilian companies, the study found, give excessive importance to the position. In a typical centralized company, and send the heads desmandam not give satisfaction. They have autonomy, for example, to decide who will be hired or fired. With some frequency, give preference to friends at the expense of those who achieve the best results.
Nor is the head of a company authoritarian consult employees before making decisions. Goals, bonus, budget – everything is decided behind closed doors. Who is following you know very little about the direction of the company.
Risks
Decisions Focus has its advantages. The more centralized companies can decide faster and give strategic shifts from night to day. In times of crisis, as in late 2008, this agility is paramount. “When the ship is sinking, is the commander who gives the orders.
At these times, you can not hear at all, “says Bethany. But at its worst, the centrality of innovation and clutter makes it difficult to attract the most talented people. Setubal, Itau, realized this. Despite their power, the company began to have difficulty in attracting and retaining the most promising executives.
They were interested more by investment banks or small businesses where they had the autonomy to make decisions and where they were rewarded by the results. To answer this, Itaú created in 2010, an unprecedented program partners, which gave the bank’s shares to a group of 100 high-performing employees. Rank or seniority did not count.
In 2011, Itaú took another step toward democracy. Since then, no bank executive has the autonomy to choose his successor. The promotions are defined in five committees that bring together people and decide based on the results.
“We could even continue sending as before,” says Marcelo ORTICELLI, human resources director of Itaú. “The problem is that there was a high risk that the younger simply stop obeying.”
Democracy also tend to bring more efficiency. If only one group of people has access to information and make all decisions, employees do not understand what their role within the strategy. And do not rise from his chair to help. But if they know the company needs to save energy, turn off the light when leaving the room.
This is what is happening in the company fleet Sascar control, purchased by the investment fund GP in 2011. Every month, the 700 employees receive by e-mail data on sales and cash flow. They can suggest actions to improve the outcome next month.
The 100 executives also receive information about their individual goals. And define what should be done to improve next month. “These actions have helped increase our revenue by 30% last year. It was the best result in the last five years, “says Marcio Trigueiro, president of Sascar.
In Riachuelo retailer, sales grow on average 20% per year since 2007, when President, Flavio Rocha, gave its executives the freedom to choose a compensation model. Instead of dividing the profits equally, they preferred to create a ranking. The best can win up to six extra salaries per year. The worst they do not take anything.
There are several reasons that explain Brazil’s leadership in the ranking of centralization. According Betania Tanure, is a cultural issue. People of Hispanic origin, say, question unless the authority of their leaders in the family, politics and, consequently, also in companies.
Moreover, state enterprises and family groups, which are more centralizing in nature, have great weight in the Brazilian economy. Does not break with that culture overnight. Most companies still takes his first steps. Alpargatas, for example, five years ago had an unbelievable 16 hierarchical levels.
There were, for example, the sector manager, area manager and department manager. The levels were reduced gradually and are now only six. It may take decades before companies like Alpargatas reach the level of openness of Promon – that if they want, of course.
It makes 42 years that the company created its first affiliate program. Today, 1,300 of its 1,600 employees are actions that allow to vote in elections for officers and directors. The optimal dose of decentralization, each company will find over time. “If companies want to attract good people, they must listen to them,” says Roberto Setubal. “It is no going back.”