Rubens de Almeida é engenheiro, jornalista, empresário e sócio de uma… Finishup!
“Ao contrário do que se pensa popularmente, empreender não é exclusividade dos jovens”, foi com essas palavras que o vice-presidente da Fundação Kauffman, Dane Stangler, abriu seu depoimento no Comitê de Envelhecimento do Senado americano. Seu discurso, chamado Em Busca do Segundo Ato: os desafios e vantagens do empreendedorismo sênior, revela não apenas como o empreendedorismo deveria ser estimulado nessa faixa etária, mas,, sobretudo como essas políticas de incentivo seriam vitais para a economia dos EUA.
¼ de todos os novos negócios criados nos EUA foram capitaneados por empresários de 55 a 64 anos
Os números da Fundação Kauffman impressionam: em 2012, 23,4% das empresas foram abertas por empresários com idades entre 55 e 64 anos, ¼ de todos os novos negócios criados. Um aumento de 14% desde 1996. O que é mais surpreendente, no entanto, é que os maiores de 55 começaram novos negócios numa proporção maior do que qualquer outra faixa etária.
¼ dos americanos de 44 a 70 anos pensa em abrir um negócio ou uma ONG
Dados da Encore.org, organização baseada em São Francisco, que estuda o mercado de trabalho dos baby boomers revelam que ¼ dos americanos entre 44 e 70 anos estão interessados em abrir sua própria empresa ou sua própria ONG.
7% dos empreendedores no Brasil tem mais de 55 anos
No Brasil, já existem estudos apontando o empreendedorismo como opção para a crise da Previdência Social e até sugestões para incluir o incentivo ao empreendedorismo no Estatuto do Idoso. De acordo com a pesquisa Global Entrepreneurship Monitor (GEM), elaborada pelo SEBRAE em parceria com o Instituo Brasileiros de Qualidade e Produtividade (IBQP), do total de empreendedores que abriram uma empresa nos últimos três anos, cerca de 7% têm mais de 55 anos.
Empreender depois da aposentadoria é, sem dúvida, uma tendência. Mas como?
Fomos entrevistar Rubens de Almeida, engenheiro e jornalista, 55 anos, empresário, investidor e empreendedor em empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação. Mais especificamente, um especialista em finishups, expressão que ele criou para as startups dos mais de 50.
Fizemos 10 perguntas para Rubens de Almeida sobre sua experiência como empreendedor. Inspire-se.
1. Finishups…você criou essa expressão. Quer dizer o que?
A expressão finishups surgiu durante o desenvolvimento dos contatos iniciais de viabilização de investimentos de venture capital em uma empresa S.A. da qual faço parte como acionista. Estávamos conversando com fundos de investimentos e investidores independentes para constituir uma startup na área de inteligência geográfica e, de repente, percebemos a audácia do grupo de participantes iniciais, cuja faixa de idade estava entre os 50 e 72 anos! Agíamos exatamente como jovens empreendedores, animados na busca dos primeiros investimentos e em determinado momento alguém perguntou se éramos uma startup. “- Claro que somos”, respondemos. Mas, imediatamente olhamo-nos uns aos outros, caímos na risada e ao somar os muitos anos profissionais daquela sala, cunhei a expressão: “somos mais do que uma startup. Somos uma finishup!”.
2. Como você descreveria esse grupo de empreendedores de mais de 50?
Como profissionais, já havíamos passado por todas as etapas de uma carreira. Altos e baixos, acertos e erros, sucessos e desilusões. Todos de classe média, universitários, com relativa tranquilidade familiar, filhos criados ou encaminhados, mais ou menos com as mesmas expectativas de continuar trabalhando ainda que estivéssemos próximos da idade de vestir o pijama.
Alguns de nós chegamos à diretoria e até à presidência de companhias. Outros aposentados ou no final da estrada acadêmica, com títulos de professor-doutor. Uns com uma certa poupança, outros mais atrapalhados com o dinheiro após a fase de investimentos nos filhos e a inevitável queda nos rendimentos com a redução das oportunidades profissionais. “Enfim, não dava para comparar a nossa iniciativa empresarial as startups dos jovens, principalmente no mercado competitivo de TI.
3. Qual a diferença entre uma finishup e uma startup?
Finishup é um bom adjetivo para definir o que estávamos fazendo, não como oposição à força e entusiasmo dos jovens empreendedores, mas, talvez, como uma diferenciação do nosso projeto de empresa, calcado também em criatividade e boas ideias, mas, principalmente, nos relacionamentos e experiências anteriores da vida profissional de cada um.
No lugar da juventude, a experiência. Em vez de apenas entusiasmo pela inovação, a consciência de que é sempre preciso apresentar fórmulas consistentes e convincentes. Para substituir o ânimo, a velocidade e a vitalidade de superar com facilidade noites mal dormidas, a tranquilidade de pegar no telefone e sempre conhecer alguém que trabalha ou conhece aquele detalhe importante do negócio ou pode nos apresentar um dirigente de uma grande empresa ou um especialista com quem precisamos falar.
Ou seja, vejo que a ousadia de empreender em uma idade madura poderia ser uma espécie de complemento às iniciativas dos mais jovens. Talvez até, pudéssemos mesclar os diferenciais competitivos de jovens e cinquentões.
4. Empreender depois dos 50 vai ser a única alternativa para essa legião de boomers que estão se aposentando antes de se sentirem prontos para parar de trabalhar?
Acho que o problema é mais sério do que ter ou não vontade de parar. Primeiro que a lógica da aposentadoria fazia sentido para uma sociedade cuja expectativa de vida com qualidade não superava os 60 ou 65 anos. Chegamos ao novo milênio com uma população que resiste muito mais anos e começa a colocar em xeque os cálculos atuariais da aposentadoria em todos os países. Não há e não haverá recursos dentro da própria sociedade para pagar vencimentos para os mais velhos por tantos anos a fio, sem que eles também contribuam para a geração das riquezas.
5. Quando vc começou a montar sua empresa, qual era o discurso? Como foi convencer as pessoas?
Fazer o discurso de uma finishup é uma diversão. No meu caso particular, não monto apenas uma empresa ou compro uma franquia para servir café para o resto da vida, ainda que seja com aquelas maravilhosas máquinas que só existiam na Itália. Não! Monto empresas, crio tecnologias, reúno potenciais sócios e ponho-as para rodar todos os dias!
É uma diversão porque podemos brincar até com aspectos negativos, por exemplo, dizendo para os investidores que ou eles fazem o investimento logo, ou poderão perder o seu sócio e suas boas ideias simplesmente porque ele morreu! Mas é muito mais que isso. Ser um finishup é não acreditar que o fim precisa ser “pra baixo”, reduzido ao pijama, ao esquecimento de uma casa de repouso ou à cadeira de balanço. Porque não terminar a vida no auge? E os exemplos são muito bons: o jornalista Roberto Marinho fez um monte de coisas legais na vida, mas só se tornou uma lenda quando aos 60 anos criou a rede globo. Com o Steve Jobs, a retomada da Apple também aconteceu após os 50. Então, por que não pensarmos e realizar ou demonstrar o nosso legado no final da vida?
6. Como é o relacionamento com os sócios nessa fase da vida?
Os sócios são sempre um problema, como todos que os têm, sabem. Mas você pode usar sua experiência e sabedoria da idade mais avançada até para definir melhor os limites dessas interpenetrações de interesses que uma empresa exige. Não é porque temos uma afinidade intelectual que precisamos pensar que somos os melhores amigos e que as famílias precisam conviver.
Acho que essa objetividade nas relações para ganhar dinheiro junto a partir da conjugação de esforços e habilidades, sem nenhum compromisso de convivência obrigatória até ajuda na formulação dos negócios. É claro que as pessoas se aproximam e precisam avaliar corretamente se há, de fato, uma proximidade de valores e expectativas entre elas, mas isso é o que faz o sucesso ou o insucesso de qualquer negócio, em qualquer idade.
7. E o discurso para os investidores, como se cria essa estratégia de vender uma finishup?
Para os investidores, ainda é uma novidade e se percebe um certo estranhamento. Por que esses caras continuam com ânimo para falar em inovação, com toda essa experiência que eles tem? É claro que deve gerar algum tipo de dúvida, mas que logo passa quando passamos a agir como jovens empreendedores que realmente acreditam em suas ideias.
Mas faltam algumas práticas importantes nos processos de decisão de investimentos. Por exemplo, ao fazer investimentos em uma empresa cuja mola-mestra são pessoas mais velhas, há que se pensar, por exemplo, na continuidade do negócio, nas exigências na reprodução do conhecimento, na formação de novas lideranças que venham a substituir os fundadores e até na questão da sucessão familiar, que é sempre um ‘pepino’. Ou seja, são questões importantes que atrapalham muitas empresas após algumas décadas de história e que não cabem em uma startup de jovens, mais do que motivada por uma vida inteira pela frente.
Então, o que parece ser uma desvantagem, passa a ser um diferencial. Ou seja, é importante contextualizar e mostrar para os possíveis investidores que você está consciente dos riscos e que seu plano de negócio prevê todas as necessidades, inclusive processos criativos de modelar a sucessão familiar, caso ocorra uma tragédia.
8. Você acha que simplesmente por termos sido durante toda vida empresários de nós mesmos e gestores da nossa trajetória profissional, estamos naturalmente prontos para empreender? O que falta?
Uma coisa que perdemos ao longo de uma carreira profissional são as ilusões de que somos os melhores, que somos imprescindíveis e essenciais em qualquer situação. A vida nos ensinou que as oportunidades vêm e vão, que o sucesso pode ser passageiro e que não ha desgraça que dure para sempre. Sabemos que nada acontece se não nos mexermos e que não basta ter boas ideias e sermos brilhantes, se não as pusermos em prática.
Mas nem todos estão prontos para empreender. Se você foi aquele funcionário-padrão, que sempre seguiu as regras, nunca lutou por mais espaço, teve medo de colocar suas ideias para não perder a posição, talvez tenha mais dificuldade de sair por aí e tentar fazer novos negócios. Acredito que há pessoas que simplesmente não conseguem sair do lugar.
Mas não é porque você é jovem que vai ter uma atitude de empreendedor. Vejo muita gente fazendo concurso público em busca da eterna estabilidade (que é ilusória e cada vez menos provável). Alguns até terão bons salários, mas será que realizarão algo verdadeiramente seu na vida? Deixarão algum legado? Alcançarão a felicidade repetindo tarefas como autômatos?
Claro, há sempre a aposentadoria sedutora na cabeça daqueles que não gostam do trabalho que fazem. Mas quem é empreendedor não consegue esperar essa felicidade de fazer nada.
9. Qual é o erro mais provável na hora de montar uma finishup? Aquele erro que todo mundo comete e que poderia ser evitado?
Acho que o maior erro ao montar uma empresa é não fazer uma boa avaliação do mercado e do porque a sua iniciativa pode ser diferente e alavancar clientes. Ou seja, o importante é entender o seu próprio diferencial, o que você acrescenta aos negócios e que ninguém pode tirar de você.
Outro ponto importante diz respeito a olhar o mercado e perceber, primeiro se não há gente oferecendo exatamente o que você pretendia fazer e, segundo, se o mercado consegue entender o que você está oferecendo. Eu mesmo já tive a oportunidade de tentar negócios que só depois de muitos anos o mercado passou a assimilar. É comum – entre as pessoas animadas com a suas próprias idéias – achar que todos vão compreender ou estão precisando o que você está oferecendo.
10. Quais os conselhos que você daria para quem quiser se lançar num projeto desses?
O principal conselho é não apenas estruturar as suas boas ideias, mas fazer contas, montar uma planilha onde você possa comparar o quanto de tempo está investindo em um negócio e verificar se há margens suficientes para ele remunerar você. Geralmente é uma conta simples, mas as pessoas que estão animadas em fazer um novo negócio simplesmente não se lembram de fazer o cálculo de quanto vão ganhar, em cima do que vão gastar para trabalhar. Nessa conta, tem que calcular o preço do seu tempo, quanto custa a sua hora de trabalho. E considerá-lo como um dos custos do serviço ou do produto que você está colocando no mercado. Se você mirar apenas no lucro da operação, vai esquecer que você teve que trabalhar de graça para ganhar aquele lucro.
11. Voltando ao início…você acha que as finishups são tendência? E se são, vão conseguir ultrapassar essa barreira que é a ideia de ‘velhos aposentados’ que temos tão arraigada em nós?
Ser velho não é ruim. Ainda mais agora que a qualidade de vida pode ser boa, em função dos avanços médicos e da consciência da saúde integral. É claro que doem as costas, os joelhos não são mais ‘aquela brastemp’ e por vezes você esquece aquele maldito nome. Mas isso também pode ser divertido. Costumo falar em reuniões para que os jovens tenham paciência com o “velhinho”. Tenho consciência das minhas limitações, mas torno-as engraçadas. E elas não são piores do que a insegurança ou a falta de articulação de outra pessoa presente. E tenho certeza que na hora da animação de uma nova ideia ou ação, eles esquecem a idade que eu tenho e me consideram do mesmo time em termos de criatividade e vontade de resolver os problemas que seria apresentado aos jovens: bons planos de negócio, apresentados de forma competente, com números consistentes e muita animação sempre serão a fórmula de conquistar parceiros para suas iniciativas.
Basta acreditar.