O papel que o CEO desempenha na sociedade mudou. Mais: as expectativas em relação ao cargo também passaram por transformações. Embora ainda tenham de ser confiantes e muitas vezes agir com autoridade, qualidades que tornam o líder mais “humano” se tornaram fundamentais. Principalmente porque, agora, suas ações são muito mais vigiadas. Os chamados stakeholders (públicos com os quais a empresa se relaciona, como investidores, clientes, funcionários e comunidade) estão por toda a parte e usam a internet para se manifestar. É o que defende um estudo recente da firma de recrutamento de executivos Heidrick & Struggles. A empresa entrevistou pessoalmente 150 líderes do mundo todo sobre as mudanças e desafios na função de CEO, e analisou as conversas com a ajuda da Saïd Business School, da Universidade de Oxford.
“Atualmente, em razão de as redes socias permiterem instantaneidade — mesmo que sem intimidade, já que você não está conversando cara a cara —, as pessoas querem ver o ‘lado humano’ de seus líderes”, diz Torrey Foster, diretor da Heidrick & Struggles para as Américas. “Querem entender que eles têm um lado pessoal, que se importam com sua família, que os filhos deles passam pelos mesmos desafios. Tudo isso dá uma dinâmica de conectividade, uma dimensão humana, que pode resultar em seguidores mais fieis.”
Segundo o executivo, isso não significa que o executivo deva abrir completamente sua vida pessoal, mas compartilhar elementos do cotidiano com os quais outras pessoas possam se identificar, como um livro que acabou de ler. Selecionamos as principais dicas definidas pelo relatório.
Transparência
Nos últimos anos, stakeholders se proliferaram, constatam os CEOs. O público hoje tem mais poder, graças à internet. Para 75% dos entrevistados, o papel do CEO mudou. Experiências passadas e abordagens tradicionais não são mais um guia confiável, dizem. Em um mundo com muito mais conectividade e olhos por parte, o líder precisa reinventar a forma como conduz sua empresa, cria estratégias e se comunica. “Você lida com transparência para ser consistente e, ao mesmo tempo, percebe que nem tudo deve ser dito, embora tudo que é importante deva ser dito”, observou um entrevistado. Os líderes ainda enfrentam o desafio de serem mais “humanos”. Ou seja, saberem realizar abordagens de um jeito mais sensível, engajar as pessoas e se importar mais. Um dos entrevistados destaca: “Os melhores líderes são seres humanos acima de tudo.”
Mais rápido
Ao considerar as transformações que acontecem ao seu redor, 94% dos entrevistados destacaram a velocidade com que elas ocorrem. Preocupar-se demais com o ritmo das mudanças, no entanto, resulta em um sentimento de urgência e pressão, que é muito prejudicial. O CEO acaba dando a mesma importância para questões que não merecem a mesma atenção. Entender de maneira clara o propósito e significado da transformação permite que o líder priorize as mudanças certas. É o que o relatório chama de “S³”: speed, scope and significance (velocidade, escopo e significado). “Quando uma nova mudança surge, você tem de separar o nível ‘já fazendo barulho’ do nível normal, e então ser capaz de determinar quão rápido aquela mudança vai se manifestar ou romper o que você está fazendo”, defendeu um entrevistado.
O poder da dúvida
A maioria dos entrevistados (71%) diz lidar com dúvidas. E isso não pode ser encarado como algo ruim — deve ser abraçado. A dúvida é parte da tarefa de “humanizar” do CEO. Além disso, duvidar pode ser uma ferramenta importante na hora de tomar decisões melhores. Entender por que você se sente desconfortável em relação a determinado assunto permite que você solicite informações e perspectivas adicionais de maneira eficiente. O resultado, mais tarde, são decisões tomadas de forma mais confiante, com base nos novos dados fornecidos. “Nunca é preto ou branco, existem sempre tons de cinza ao redor de qualquer decisão”, aponta um CEO. “Um certo nível de dúvida profissional deveria ser qualidade de qualquer bom líder”, diz outro.
Escolhendo entre o certo… e o certo
Dois terços dos CEO levantaram espontaneamente durante as entrevistas o desafio de encontrar um balanço na hora de fazer decisões. Segundo o relatório, o que torna tudo mais complicado é que as alternativas nunca incluem um certo e um errado. Com stakeholders fazendo demandas que competem entre si, cada vez mais o CEO tem de escolher entre “o certo e o certo”. Um entrevistado alertou que, se sua vida parece simples, confortável e sem decisões difíceis, isso é um problema. “Se tudo fosse preto ou branco, você não precisaria de um CEO.” O relatório defende que, diante desse cenários, líderes tem de começar a considerar cada vez mais o “isso e aquilo” em vez do “isso ou aquilo”.
Renovação contínua
A pesquisa perguntou para os CEOs como eles desenvolveram as habilidades necessárias para ocupar o cargo e como chegaram ali. Muitos descobriram o gosto pela liderança na juventude, ainda na escola, em posições de representatividade. Durante a carreira, futuros CEOs tipicamente eram os profissionais que aceitavam papeis desafiadores dentro da empresa. Entre os entrevistados, metade subiu ao cargo graças a promoções internas, enquanto 39% conseguiu a posição em empresas nas quais não trabalhavam antes . Somente 8% fundaram as companhias que lideram. “Acredito que a maioria dos CEOs não está muito lapidada quando chega ao cargo. Acho que existe, provavelmente, mais aprendizado na função do que as pessoas acreditam”, disse um CEO. O cargo exige renovação contínua, então é preciso criar um ambiente que fomente curiosidade e aprendizado.
Sucessão
O relatório também fala sobre a escolha de um sucessor. A maioria dos entrevistados reconhece que desenvolver talentos e planejar sua sucessão faz parte dos requisitos fundamentais da função. Potenciais CEOs tem de ter, segundo o estudo, experiência (gestão empresarial, financeira e de pessoas), mas aumenta a necessidade de mais sensibilidade também. Os futuros profissionais a ocupar o cargo precisam ser pensadores flexíveis e sistemáticos, além de saber lidar com incerteza, complexidade e constante mudança. “Líderes deveriam acreditar na mudança como o oxigênio do crescimento e da criatividade”, aponta um entrevistado. Habilidades de comunicação precisarão ser mais bem trabalhadas. Além disso, líderes do amanhã devem enxergar o aprendizado constante não como uma opção, mas um dever.
por Edson Caldas